segunda-feira, 6 de março de 2017

O mosquito e o vampiro

                                                                                              *Edson Amaro

            Dilma Rousseff era uma fonte inesgotável de asneiras. Dizia coisas sem sentido e a imprensa não perdoava. “O aeroporto é uma outra forma de transporte”, disse a ex-presidenta. “Sempre que você olha uma criança, há sempre uma figura oculta, que é um cachorro, o que é algo muito importante”, disse de outra feita a chefe da Nação, em outro discurso sem sentido algum. E aí descobrimos que o livro “A vida quer é coragem”, pretensa biografia de Dilma Rousseff escrita por Ricardo Batista Amaral, é uma obra de ficção, pois a intelectual que protagoniza a obra nunca existiu.
            E daí ela sofre um golpe de seu vice, Michel Temer, outro poço de boçalidade. Declara-se poeta, mas que raio de poeta é esse que não serve nem para criar um slogan para seu desgraçado governo? Simplesmente copia o lema da bandeira, “Ordem e Progresso”. É inesquecível a cena em que, ao inaugurar a linha 4 do metrô (que antecipou-se à linha 3, numa aritmética inexplicável), disse que seu correligionário, o parasita Pezão, que esvaziou os cofres do estado do Rio de Janeiro distribuindo isenções fiscais tal como se fossem doces de Cosme e Damião, e que no momento submetia-se a uma quimioterapia, tinha ficado mais bonito calado. O asno que ocupa a cadeira presidencial perdeu uma ótima oportunidade de ficar calado.
            Mas se a imprensa ridicularizava tanto as bobagens ditas por Dilma, por que silencia diante das sandices de Michel Temer? Seria por que o “governo de salvação nacional” (assim Temer, no ato da posse, chamou esse amontoado de corruptos – lembram que toda semana caía um ministro nos primeiros meses?) tem gasto muito mais que Dilma com publicidade? Apesar de tanto falar em austeridade, o governo federal gastou em dezembro de 2016 106% a mais com publicidade em relação a dezembro de 2015. Dizem por aí que todo homem tem seu preço, mas parece que as consciências da imprensa brasileira estão em promoção.
            Em qualquer país cuja imprensa tivesse vergonha na cara, todos os jornais, rádios e TVs condenariam unanimemente uma PEC que congelasse por 20 anos os investimentos em Saúde, Educação e Pesquisa, com a única concessão de reajustes conforme a inflação. E por uma razão simples: o analfabetismo funcional, a zika, a diabetes, o atraso tecnológico e científico não respeitam índices inflacionários. Ou alguma vez o câncer deixou de acometer um cidadão por ele estar desempregado? Será que as doenças que contraímos são de acordo com nosso poder aquisitivo?
            No interior de Minas, no Vale do Rio Doce, o mesmo Rio Doce destruído pela irresponsabilidade e pela ganância da Vale e da Samarco, crime ecológico impune até agora, reapareceu a febre amarela em sua variante rural, transmitida pelo mosquito Haemagogus. Segundo pesquisadores da Fiocruz, o desastre ambiental tornou possível essa epidemia: o ciclo da febre amarela estava antes restrito à floresta. Com a degradação ambiental, os animais, macacos inclusive, hospedeiros do vírus, aproximaram-se mais das comunidades.
            A epidemia de febre amarela já é argumento suficiente para mostrar que as medidas de “austeridade” do vampiro Temer são perfeitas para impedir o progresso do nosso país e afetar mortalmente as camadas mais pobres de nossa sociedade.
            Ou seja: Dilma é tão incompetente que escolheu o vampiro Temer como vice.
            Obrigado, mosquito Haemagogus, por mostrar a todo o Brasil o que o jornalismo se recusa a dizer.

*Edson Amaro é poeta, ator e tradutor. Publicou pela editora Buriti sua tradução do romance “Valperga’, de Mary Shelley, e pela editora Fragmentos o livro de poemas “Ouro Preto e Outras Viagens”.

            

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