*Edson Amaro
Como
sabem todos,
No
ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo de 2013,
Terceiro
ano do governo de Dilma,
Quinto
ano do mandato de Obama,
Terceiro
de Pepe Mujica,
A
Polícia Federal encontrou,
No
dia 24 de novembro,
Numa
fazenda de propriedade do senador José Perrella,
Num
helicóptero de propriedade da Limeira Agropecuária,
Empresa
do filho do senador,
O
deputado estadual Gustavo Perrella,
Um
helicóptero com 450 k de cocaína.
Como
disseram os jornais,
A
Fazenda era dos Perrella,
O
helicóptero era dos Perrella,
O
piloto era funcionário lotado no gabinete de Gustavo,
Mas
ninguém até hoje descobriu
A
quem pertencia a ilícita carga.
Um
dos silenciosos policiais
Não
conseguiu conter um espirro e um peido simultâneos,
E
pelo orifício de onde saiu o constrangido peido
Saiu
uma pergunta que a boca reprimia:
“A
quem pertence o pó achado na fazenda dos Perrellas na aeronave nos Perrellas?”
A
Pergunta nasceu nua
Como
nascemos todos nós
E
nua ergueu-se entre os jornalistas
Que
fotografavam a operação
Mas,
pudibundos, eles desviaram as câmeras –
Preferiram
castamente guardá-las para quando uma atriz fizesse topless.
A
Pergunta, atrevida,
Dançou
a Macarena ao ar livre –
Dançou
daquela maneira nietzschiana,
Que
é quando dançamos e os outros não ouvem a música –
Mas
os bem pensantes profissionais
Da
segurança e da imprensa
Fingiam
não ver a louca.
A
Pergunta abriu suas grandes asas
–
Sim, as perguntas nascem aladas ou você não sabia? –
E
ganhou os céus capixabas.
Logo
esticava-se nas areias de Ipanema
E
no dia seguinte transitava na Capital Federal
Entre
os engravatados parlamentares,
Mais
nua que o rei da história infantil
Mas
os parlamentares não queriam quebrar o decoro e apalpar as nádegas da Pergunta.
A
Pergunta foi às redações dos jornais,
Às
delegacias,
Aos
tribunais,
Exibindo-se,
despudorada.
Gritava
aos quatro ventos que estava sempre fértil
E
em seu perpétuo cio buscava homem ou mulher que a fecundasse
Para
que finalmente pudesse parir a resposta.
Mas
todos fingiam ignorá-la.
Tal
como o profeta Isaías andou nu por três anos,
Assim
mostrou-se nua a Pergunta despudorada,
E,
ao fim desse tempo,
Arrastou
sua irritante virgindade para dentro de uma igreja
E,
na ponta dos pés,
Roubou
um rosário
E,
frustrada, encaminhou-se para um cemitério carioca
E
foi rezar pelo eterno descanso de um adolescente do Morro do Borel,
Morto
pela polícia em 30 de junho de 2016,
Porque
o saquinho de pipocas que carregava
Foi
confundido com um embrulho de drogas.
(03-01-2017)
Edson
Amaro de Souza publicou pela editora Fragmentos seu primeiro livro de poesia,
“Ouro Preto e Outras Viagens”, e publicou em versão e-book, no site Amazon, sua
tradução de “Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio”, de Maquiavel.